Todas as inteligências concorrem para a obra geral, seja qual for o grau a que tenham chegado, e cada uma na medida das suas forças; umas no estado de encarnação, outras no estado de Espírito. Em toda parte a atividade, do ponto mais baixo até o mais alto da escala, todas se instruindo, se ajudando mutuamente, estendendo a mão umas às outras para atingir o cume. Assim se estabelece a solidariedade entre o mundo espiritual e o mundo corporal, em outras palavras, entre os homens e os Espíritos, entre os Espíritos livres e os Espíritos cativos. Assim se perpetuam e se consolidam, pela purificação e continuidade das relações, as simpatias verdadeiras, as afeições santas. Em toda a parte, portanto, a vida e o movimento; nenhum canto do infinito que não seja povoado; nenhuma região que não seja incessantemente percorrida por inúmeras legiões de seres radiosos, invisíveis para os sentidos grosseiros dos encarnados, mas cuja visão arrebata de admiração e de alegria as almas desprendidas da matéria. Em toda a parte, enfim, há uma felicidade relativa para todos os progressos, para todos os deveres cumpridos; cada um traz em si os elementos de sua felicidade, relativa à categoria em que o coloca seu grau de adiantamento. A felicidade deve-se às qualidades próprias dos indivíduos, e não ao estado material do meio onde eles se encontram; ela existe então em toda parte onde haja Espíritos capazes de serem felizes; nenhum lugar circunscrito lhe é designado no universo. Seja qual for o lugar onde se encontrem, os puros Espíritos podem contemplar a majestade divina, porque Deus está em toda a parte.
Entretanto, a felicidade não é pessoal; se fosse tirada apenas de si mesmo, se não se pudesse compartilhá-la com outros, seria egoísta e triste; ela está também na comunhão de pensamentos que une os seres simpáticos. Os Espíritos bem-aventurados, atraídos uns para os outros pela semelhança das ideias, dos gostos, dos sentimentos, formam vastos grupos ou famílias homogêneas, nas quais cada individualidade irradia suas próprias qualidades, e é penetrada pelos eflúvios serenos e benfazejos que emanam do conjunto, cujos membros ora se dispersam para se dedicarem à sua missão, ora se juntam num ponto qualquer do espaço para comunicarem uns aos outros o resultado de seus trabalhos, ora se reúnem em volta de um Espírito de uma ordem mais elevada para receber seus conselhos e suas instruções.
Embora os Espíritos estejam em toda parte, os mundos são os centros onde eles se reúnem de preferência, devido à analogia que existe entre eles e aqueles que os habitam. Em torno dos mundos avançados são abundantes os Espíritos superiores; em torno dos mundos atrasados pululam os Espíritos inferiores. A Terra é ainda um destes últimos. Cada globo tem então, de alguma forma, sua própria população de Espíritos encarnados e desencarnados, a qual se alimenta na maior parte pela encarnação e desencarnação dos mesmos Espíritos. Essa população é mais estável nos mundos inferiores onde os Espíritos são mais apegados à matéria, e mais flutuante nos mundos superiores. Entretanto, dos mundos, centros de luz e de felicidade, Espíritos se desprendem rumo aos mundos inferiores para semear neles os germes do progresso, trazer a consolação e a esperança, reanimar as coragens abatidas pelas provações da vida, e às vezes encarnam-se neles para cumprirem sua missão com mais eficácia.
Nesta imensidão sem limites, onde está então o céu? Está em toda a parte; nenhuma cerca lhe impõe limites; os mundos felizes são as últimas estações que a ele conduzem; as virtudes abrem-lhe o caminho, os vícios proíbem-lhe o acesso. Ao lado deste quadro grandioso que povoa todos os cantos do universo, que dá a todos os objetos da criação um objetivo e uma razão de ser, como é pequena e mesquinha a doutrina que circunscreve a humanidade a um imperceptível ponto do espaço, que no-la mostra começando num dado instante para acabar igualmente um dia com o mundo que a sustenta, não abarcando assim senão um minuto na eternidade! Como ela é triste, fria e glacial, quando nos mostra o resto do universo antes, durante e depois da humanidade terrestre, sem vida, sem movimento, como um imenso deserto mergulhado no silêncio! Como é desesperante pela pintura que faz do pequeno número de eleitos devotados à contemplação eterna, enquanto a maioria das criaturas é condenada a sofrimentos sem fim! Como ela é aflitiva, para os corações amantes, pela barreira que coloca entre os mortos e os vivos!
Quão sublime é, ao contrário, a ideia que o Espiritismo dá! Como sua doutrina engrandece as ideias, amplia o pensamento! — Mas quem diz que ela é verdadeira? Inicialmente a razão, a revelação em seguida, depois sua concordância com o progresso da ciência. Entre duas doutrinas das quais uma diminui e a outra amplia os atributos de Deus; das quais uma está em desacordo e a outra em harmonia com o progresso; das quais uma fica para trás e a outra avança, o bom senso diz de que lado está a verdade. Que em presença das duas, cada um, em seu foro íntimo, interrogue suas aspirações, e uma voz interna lhe responderá. As aspirações são a voz de Deus, que não pode enganar os homens.
Mas então por que Deus, desde o princípio, não lhes revelou toda a verdade? Pela mesma razão de que não se ensina à infância o que se ensina à idade madura. A revelação restrita era suficiente durante um certo período da humanidade; Deus a proporciona às forças do Espírito. Aqueles que hoje recebem uma revelação mais completa são os mesmos Espíritos que já receberam uma revelação parcial em outros tempos, mas que desde então cresceram em inteligência. Antes que a ciência lhes tivesse revelado as forças vivas da natureza, a constituição dos astros, o verdadeiro papel e a formação da Terra, teriam eles compreendido a imensidão do espaço, a pluralidade dos mundos? Antes que a geologia tivesse provado a formação da Terra, teriam eles podido desalojar o inferno de seu centro, e compreender o sentido alegórico dos seis dias da criação? Antes que a astronomia tivesse descoberto as leis que regem o universo, teriam eles podido compreender que não há nem acima nem abaixo no espaço, que o céu não está acima das nuvens, nem limitado pelas estrelas? Antes do progresso da ciência psicológica teriam eles podido identificar-se com a vida espiritual? Conceber, após a morte, uma vida feliz ou infeliz, de outro modo que não num lugar circunscrito e sob uma forma material? Não; compreendendo mais pelos sentidos do que pelo pensamento, o universo era demasiado vasto para seu cérebro; era preciso reduzi-lo a proporções menores para colocá-lo sob seu ponto de vista, sob a condição de estendê-lo mais tarde. Uma revelação parcial tinha sua utilidade; ela era sábia então, hoje é insuficiente. O erro é daqueles que, não levando em conta o progresso das ideias, creem poder governar homens maduros como se fossem crianças.
Referências:
O Céu e o Inferno ou a justiça divina segundo o Espiritismo - Primeira parte - Capítulo III - Allan Kardec.